Uma particularidade dos apartamentos – vista como uma falha no projeto – é o tamanho (e falta de iluminação) das cozinhas. Pelo contrário, não se trata de uma falha, mas de uma consequência do próprio conceito de projeto, uma vez que o conjunto já disponibilizaria todos os serviços necessários, para que o morador evitasse fazê-los em casa.
A especificidade da função de cada ambiente se torna evidente no projeto, dissociando-se da multifuncionalidade anterior. Cada cômodo já era exposto na brochura de apresentação mobiliado, acompanhado de seu “manual de instruções”, o que demonstra claramente os usos e ocupações previstas por Niemeyer e a imposição do modo de vida planejado. A ausência da área de serviço é uma prova de como a organização e dimensionamento dos espaços são determinados pela ideologia modernista do projeto.
Todo o projeto demandava técnicas absurdamente avançadas para a sua conclusão na época, sendo assim um laboratório arquitetônico e hoje uma grande prova da persistência de alguns homens. Foi necessária a abertura de uma série de exceções no Código de Obras. A principal delas foi a que possibilitou a autorização para construção da passarela que uniria os dois blocos, atravessando a Rua dos Guajajaras. As duas tentativas fracassaram: a primeira, em concreto armado, e até mesmo a segunda, em treliça. Permaneceram por muito tempo os “arranques” de ambos os lados, até a do bloco A ser excluída para dar lugar à área de lazer, resumida a um parquinho. A do bloco B jaz até hoje intacta, esquecida entre pombos e entulho.
A trágica repercussão da construção se originou com uma inesperada crise da época (conjunto de fatores que tiveram origem no século XIX), que tornou o empreendimento inviável, deixando sua construção inacabada e firmando uma consciência negativa. Por ter sido um projeto estudado por um longo período (nada menos que 20 anos), sofreu várias modificações e houve pelo menos cinco interrupções no decorrer da construção. As obras tiveram início em 1951 e foram interrompidas em 1956, sendo posteriormente retomadas em 1968. Os apartamentos começaram a ser entregues em 1971 e a inauguração do Terminal Turístico Rodoviário foi realizada apenas em 1985.
Hoje, a construção de qualquer obra mais ousada é bem aceita, mas não seria necessariamente vista com bons olhos na década de 50, figurando como uma incógnita numa sociedade conservadora, onde a rígida herança cultural inibe o progresso. Fica em aberto a questão: se o arquiteto não constrói situações, ele não revoluciona, não há mudança no modo de vida, permanecendo a sociedade inerte e centrada na ideologia de vida e moradia tradicionalistas.
Enfim, a ideia que deve ser ressaltada é que o CGK está vivo com sua intensidade cotidiana efervescente e jamais poderia ser esquecido. Se a cidade não assumi-lo, ele ainda ali estará, impondo-se à opinião pública, sempre persuadida pela maioria. Deveríamos perceber logo todo o sentido que tal fizera no passado, como um monumento, que se não foi de vitória, foi de esperança, mas jamais como uma ruína.
(Fotos: Patricia Yegros)